
Eu decidi deixar o Egito por motivos de segurança em janeiro de 2015. A perseguição contra cidadãos, ativistas e jornalistas da oposição síria ao regime de Bashar al-Assad havia se instalado desde o golpe militar de Abdel Fattah al-Sisi, em meados de 2013.
Sabendo que a maioria dos países agora recusam vistos aos cidadãos sírios, tive que enfrentar duas únicas opções de refúgio: a mais próxima, Turquia, foi logo descartada porque a maioria da oposição islâmica síria está concentrada em tal país; decidi aceitar a mais longínqua, Brasil, que significou embarcar numa aventura.
Eu não conhecia absolutamente ninguém no Brasil, mas graças à ajuda de alguns amigos que realizaram seus contatos rapidamente, fui recebido por uma jovem síria habitante de São Paulo. Ela me apresentou a muitos jornalistas e ativistas da esquerda brasileira. Eu ainda então estava trabalhando com muitos dos jornais da oposição síria e com os alinhados à revolução árabe-síria.
A princípio, o Brasil pareceu um país ideal por várias razões. A primeira e mais evidente seria que o novo país está longe de me impor censuras como acontecia na Síria, podendo eu trabalhar livremente aqui, dizendo o que eu quiser, sem medo.
Em segundo lugar, muitos jornais árabes me convidaram a ser um correspondente – talvez por conta do baixo número de jornalistas árabes neste país. Em terceiro lugar, eu poderia estabelecer muitas amizades com pessoas que trabalham no mesmo campo, mostrando a eles meu nome de nascimento sem receios.
Finalmente, a satisfação parecia completa por ser São Paulo uma cidade aberta ao mundo, uma grande reunião de múltiplas culturas. Mas em troca eu tive alguns problemas.
O de maior importância é o linguístico, já que eu levarei muito tempo para dominar o português de forma fluente. E, apesar de frequentar aulas em ONGs que cuidam de refugiados, saber a língua local é urgente para meu trabalho, pois assim serei livre da tradução de minhas entrevistas por terceiros.
Além disso, sinto falta de uma carteira de identidade, fato que ligeiramente atrapalha meu trabalho: eu não posso abrir uma conta bancária, usando contas de amigos brasileiros para receber os pagamentos dos jornais árabes.
Outra mudança relevante foi que até ano passado eu estava escrevendo na área política – que eu adoro – e, depois da minha chegada ao Brasil, passei a cobrir os assuntos da comunidade árabe imigrada.
Eu preciso de alguma paz e estabilidade para começar a escrever um livro sobre a revolução síria e eu acho que, aos poucos, encontro esta calma em mim por aqui. Desejo também realizar um curta-metragem sobre a vida neste país, a interação do povo sírio com a sua revolução e sobre se desejam retornar à Síria depois do término da guerra.
Pessoalmente, eu retornarei à Síria depois da guerra para me reunir com minha família e, em seguida, voltarei ao Brasil porque quero continuar minha carreira. E porque eu o amo.
Por Victorious Bayan Shams